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“Perdi a minha filha princesa…”
“A sua filha nunca mais vai abrir os olhos!” – estas palavras pareceram-me tão frias e duras, sobretudo irreais. Nesse momento, o mundo desabou em cima de mim. Acabei deitada numa cama de hospital devido a um ataque de pânico.”

2/10/2015
Autor: Cristina Felizardo - Conselheira do Luto, Diretora e Vice-Presidente da APELO

 

Nélia Pereira relata como se fosse hoje, o momento em que recebeu a notícia de que a sua filha estava a morrer. Tânia, uma bela jovem de 27 anos, morreu em Outubro de 2012, seis meses após lhe ter sido diagnosticado um tumor maligno no cérebro.

 

Tudo começou quando, após dores de cabeça persistentes, Nélia convence a filha a ir ao médico. Não foram precisos muitos exames para o profissional de saúde perceber o que estava a causar esse sintoma: um tumor cresce no cérebro fazendo compressão no sistema nervoso central.

 

O diagnóstico era terrível e Nélia sente um sufoco ao temer pela vida da filha. A tragédia ocorre, quando após a biopsia, Tânia entra em coma profundo, do qual, os médicos responsáveis acreditam que não acordará.

 

Lágrima de esperança

“A sua filha nunca mais vai abrir os olhos!”– a frase ecoa na mente de Nélia, uma e outra vez. No entanto, esta mãe tomou uma decisão: o coração ainda batia no peito da sua filha, por isso, tomaria conta dela até ela voltar a abrir os olhos. Afinal, enquanto há vida à esperança! E assim foi.

 

Nélia, todos os dias, dirigia-se ao hospital onde a filha estava internada e aí passava o dia com ela, penteando-a, passando creme no rosto e corpo, arranjando as unhas da “filha princesa”, falando constantemente com ela, contando-lhe as novidades do pai, que estava a trabalhar.

 

Um dia, Nélia repara numa lágrima que escorre pelo rosto da filha. Chama de imediato a médica e a surpresa abate-se sobre todos: Tânia retomara a consciência e abrira os olhos!

 

Nélia sente uma sensação de vitória. No entanto, essa sensação não perdurou. Tânia estava confinada a uma cadeira de rodas, incapaz de falar e o tumor inoperável estava a crescer a um ritmo alucinante. Tânia teria mais algumas semanas de vida, não mais.

 

Nélia permanece ao lado da sua filha até ao fim. E mais uma vez o seu mundo desaba, no momento em Tânia fecha os olhos, desta vez, para nunca mais os abrir.

 

O profundo reconhecimento: a Tânia morreu

Nélia, em choque, não quer acreditar que após ter lutado tanto para manter a filha viva, saiu derrotada.

 

Poder-se-ia dizer que esta mãe inicia aqui o seu processo de luto. No entanto, este começou aquando da notícia do diagnóstico da doença da filha. Este é o primeiro momento em que Nélia sente que “o mundo desaba”, o que na realidade é o primeiro contacto com a perda profunda que origina luto, neste caso, a perda da sua filha saudável.

 

Depois do choque, surge inevitavelmente a descrença, a necessidade em fazer com que o passado prevaleça para manter o equilíbrio que até então garantia a serenidade e paz de espírito. Nélia recusou-se a acreditar que o coma de Tânia a ia impedir de voltar a ter a sua filha. Num esforço titânico dedicou-se a manter a imagem da sua filha de como ela sempre foi: uma linda princesa. Mas, a realidade, essa, impõem-se e o reconhecimento é sempre doloroso. Nélia teve de encarar dia após dia, de que a sua filha estava debilitada, dependente e doente.

 

Este confronto entre a descrença e o reconhecimento, entre a segurança do passado e a incerteza do presente, provoca sentimentos de agonia, desespero, aflição, acompanhados de uma tristeza profunda e mau estar físico (cansaço, taquicardia, dor de cabeça, insónia, perda de apetite, etc.).

 

É com este turbilhão de sentimentos e emoções que o profundo reconhecimento ocorre: Tânia morre. Nélia é obrigada a encarar a realidade de irreversibilidade da perda da sua filha. Sente a “dor maior” e por isso o seu mundo desaba pela segunda vez, embora desta vez, de uma forma devastadora: “bateu no fundo do poço”.

 

Batalha a batalha para vencer a “guerra”

O caminho do luto continua, oscilando entre a descrença e o reconhecimento. No entanto, a diferença é que neste momento, os momentos de descrença são menores e com menos intensidade, enquanto os reconhecimentos são menos dolorosos. Para tal, Nélia encontrou a sua estratégia: criou um espaço em casa, um local de homenagem à filha, onde a sua presença permanece viva e permite-se a passar alguns minutos do seu dia neste recanto. Sabe que a perda da Tânia é definitiva, mas este espaço ajuda a minimizar a dor do reconhecimento desta realidade.

 

A morte de filhos, o defilhar, é para a vida. Nélia está a percorrer esse caminho. Acredito que devido ao seu traço de carácter otimista, que a faz ter uma visão positiva da vida, esta mãe vá encontrar estratégias que a conduzam à superação: que lhe permitam encontrar um novo equilíbrio, que, mesmo com uma dor latente, lhe permitam voltar a bem viver!

 

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Quem é Cristina Felizardo?

Nasceu em Leiria, a 2 de Setembro de 1979, licenciou-se em Serviço Social, pelo Instituto Superior Miguel Torga de Coimbra em 2002 e iniciou carreira como Diretora Técnica de IPSS no distrito de Aveiro, onde ficaria a residir. Foi mãe em 2008, que acabou por se tornar no ponto de viragem da sua vida. Este filho, revelou ter um síndrome que ainda hoje permanece por diagnosticar, traduzindo-se num atraso global e severo do seu desenvolvimento. Por causa dele iniciou o seu percurso, primeiro pessoal e mais tarde profissional no luto, com o objetivo fundamental de ajudar outras pessoas e famílias a superar perdas profundas de forma menos dolorosa e menos prolongada no tempo. Hoje, considera que ser Conselheira do Luto não é uma profissão é uma forma de estar na vida! É guiada por uma única finalidade: ser feliz!
 
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