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Regresso às aulas
Tantas vezes que ouvi “Todos Diferentes, Todos Iguais” e pela primeira vez vi verdade nessa frase. O regresso às aulas é vivido da mesma maneira sejam eles mais ou menos especiais.

14/09/2017
Autor: Cristina Felizardo - Conselheira do Luto® / CEO do projecto Cfeliz

 

“Aquele dia não era muito diferente dos dias anteriores! Afinal eu já estava a trabalhar e ele tinha retomado o ATL, depois das férias, enquanto aguardava o início do ano letivo. Por isso, a rotina matinal não estava a ser alterada. Não obstante, eu sentia algum nervosismo, estava mais acelerada e desajeitada… tudo me escapava das mãos. No dia anterior já tinha sido a reunião de inicio de ano escolar. Não o levei, fui sozinha! Pensei que lhe ia saber bem aproveitar mais um dia de tempos livres. A reunião também não trouxe nada de diferente. A sala continua a mesma, a turma não mudou, as professoras, sim, são novas na escola, mas já com muita experiência neste mundo especial. Então, porquê este nervosismo? 
Olhei para ele, com o seu cabelinho cortado “à rapazote” como diz o avô, de camisinha vestida (queremos causar boa impressão), com as calças de ganga a desvendar como ele cresceu nesse Verão e aí percebi… o meu menino era finalista na escola primária! Ainda temos um ano pela frente, é certo, mas cá dentro, aquela vozinha já me começou a sussurrar que mais uma mudança se aproxima, mais um marco de tempo, daqueles que nos dão um banho de realidade."
Carla
 
Tantas vezes que ouvi “Todos Diferentes, Todos Iguais” e pela primeira vez vi verdade nessa frase. O regresso às aulas é vivido da mesma maneira sejam eles mais ou menos especiais.
Vejam o caso de Rodrigo, um menino de nove anos que frequenta a Unidade de Multideficiência da escola básica da sua zona de residência. O dia começou tal e qual como o dia anterior: o leite que toma pela máquina que está ligada à barriga já tinha terminado. O alarme sonoro e repetitivo diz isso mesmo. Pouco depois lá entra a mamã no quarto. Sempre com um bom dia, um sorriso e uma beijoca. Hoje um pouco mais acelerada, mas o pequeno pensou que poderia ser qualquer coisa relacionada com o trabalho. O mesmo ritual: ir à casa de banho, vestir a roupa, calçar as sapatilhas e passar o resto do tempo a seguir a mãe de divisão em divisão, até que finalmente ela esteja pronta para saírem de casa. Os sacos eram os mesmos, a mamã carrega. Mas é no elevador que cai a bomba: “Hoje começa a escola Rodrigo! Vamos para a escolinha!”. O jovem olha para a mãe a tentar perceber se era piada ou era a sério. Uhm! A mãe está a sorrir. Na criança gera-se uma onda de esperança de que tudo não passasse de uma brincadeira de mau gosto. Mas eis que saem do prédio e a verdade abate-se sobre o pequeno Rodrigo. Lá ao fundo da rua estavam a entrar no carro a senhora do 4ºA, ela e a filha, que levava uma mochila de rodinhas, cujo som a rolar no asfalto ecoava como trovões na cabeça do jovem Rodrigo. Sempre era verdade! A escola começava hoje! Um grito irrompe o ar e a mamã dá-se conta: o Rodrigo já percebeu que vai para a escola! “Vai ser uma longa viagem” – pensou ela. A viagem de dez minutos foi feita em silêncio, com o petiz a fixar durante todo esse tempo a biqueira da sapatilha. A saída do carro foi feita da forma mais lenta possível, bem como a marcha pelo pátio da escola até à sala. Nem os abraços efusivos dos colegas de turma, nem os beijos repenicados das auxiliares da sala, nem as boas-vindas dadas pelas novas professoras, conseguiram trazer um sorriso aquele rosto ainda moreno, lembrança do sol de férias. Era oficial, tinha começado mais um ano de escola. Já sem a mamã por perto, Rodrigo lá começa a perceber que não tem com quem fazer a sua chantagem emocional. Descontrai e começa a pôr em dia os miminhos interrompidos. Voltaram os sorrisos, as brincadeiras com os colegas e a melhor parte do dia: o intervalo. Tanto foi que nem se deu conta de que as horas passaram. Estava ele numa das suas corridas pelo recreio quando vê que a sua mãe tinha regressado para o vir buscar. Um pensamento irrompe: “Já?!”
E assim foi o regresso às aulas.
 
 
Cristina Felizardo
CEO do projeto Cfeliz 
Assistente Social
Social Entrepreneur - Conselheira do Luto®  - Mestre em Avaliação 
x Notificação de falecimentos
x INSCRIÇÃO WORKSHOP LUTO