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“O Luto de Pais Censurados”
O que sentem os pais que tiram a vida aos filhos? Cristina Felizardo, conselheira do luto, responde.

11/03/2016
Autor: Cristina Felizardo - Conselheira do Luto, Diretora e Vice-Presidente da APELO

 

O país foi, recentemente, abalado por tragédias pungentes envolvendo a morte de crianças causada (direta ou indiretamente) pelos seus progenitores.
 
A comunicação social deu-nos a conhecer, num curto período de tempo, um conjunto de casos dramáticos e os seus contornos difusos relativos a pais negligentes ou abusadores, que devido às suas acções, ou falta delas, conduziram a um desfecho que deixou o povo português em choque, precisamente por se tratar do maior dos nossos medos sociais: a perda de filhos. A agravar este medo comum, está a necessidade de julgamento e condenação de quem deliberadamente ou de forma negligente contribuiu para a morte dessas crianças. O enredo adensa-se quando o medo e a necessidade de condenação, são revestidos pela censura ao ser revelada a identidade dos culpados: os pais!
 
A partir deste momento, a consternação e o choque dão lugar à revolta contra aqueles que quebraram o seu dever biológico, individual e social: o de garantir a sobrevivência do seu legado.
 
Está explicado o sentimento que inundou o país.
 
Mas, e em relação a esses pais? O que será que estão eles a sentir? Estarão a sofrer a perda do seu bem maior que os acomete? Quais as razões que estão na origem destas tragédias?
 
Para um maior entendimento, será adequado abordarmos as duas situações: de negligência e de ato deliberado contra a vida de um menor.
 
Na primeira situação, deparamo-nos com pais que devido a falta de zelo, distracção ou negligência falharam no cuidado a uma criança ainda sem autonomia para sobreviver sozinha.
 
Na segunda situação, encaramos uma mãe que deliberadamente colocou as filhas numa situação de elevado risco, pondo em causa as suas vidas.
 
Assumindo que uma das premissas da condição do ser humano é a reprodução, entendemos que o instinto de preservar a continuidade dos genes através dos filhos, é inata nos pais.
 
Contrariar este instinto requer uma perturbação psíquica profunda ou um desvio de comportamento, enfim, um desequilíbrio que perturbe a homeostase biológica, individual e/ou social.
 
Sendo assim, é legítimo afirmar, que independentemente das causas que estão na origem da morte destas crianças, estes pais estão a sentir a perda do seu legado e a perspectivar a dimensão desta derrota auto-infligida.
 
Em ambos os casos, o desfecho é invariavelmente o mesmo: pais em luto.
 
Já lhes basta a desgraça do seu penar e a punição legal; não necessitam de juízes que lhe apliquem outras penas.
 
A sua pena é bem maior: a culpa emocional por terem destruído o seu bem máximo.

 

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