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Quadras festivas sem os entes queridos…
"Não há fórmulas nem receitas de como se pode sobreviver à primeira quadra natalícia"

8/01/2016
Autor: Cristina Felizardo - Conselheira do Luto

 

“Para mim deixou de existir o Natal”- diz-nos Manuel com um olhar profundo e repleto de tristeza. “Depois do que aconteceu já não faz sentido para mim estar numa festa com risos e gargalhadas, com boa comida e a família reunida à volta da mesa… só me lembra ainda com mais força e violência de que o David já não está cá!” – explica-nos recordando com tristeza o primeiro Natal que passou depois da morte do seu filho David, de 21 anos. Nesse ano, foi com a esposa passar a consoada e o dia de Natal a um hotel, afastado de casa.
 
Na casa da família Marques, é com alguma ansiedade que se aguardam as festividades da quadra natalícia. Afinal, este é o primeiro ano que o patriarca da família não vai estar presente para cortar o peru no dia 25 de dezembro.  “O nosso pai era o rei da festa de Natal!
 
Ele tão depressa se vestia de Pai Natal para distribuir as prendinhas às crianças no dia 24, como estava à mesa no dia 25, pronto para trinchar o peru e receber as filhas, os genros e os netos.”- conta-nos Alicia. Nesse ano, Alicia, como filha mais velha, recebeu a família em sua casa no Natal. “Havia alguma tristeza no olhar da minha mãe e irmãs, mas ao menos estávamos todos juntos. Decidi colocar um prato a mais na mesa… assim sentia que o papi estava connosco!”
 
“No início foi difícil. Lembro-me de no primeiro Natal, estar a olhar para os meus filhos, para os meus sobrinhos e para o resto da família e sentir uma vontade súbita de fugir! Faltava-me a minha Ana e sem ela nada daquilo fazia sentido.” – recorda Diogo, alguns meses depois de ter perdido a sua esposa, Ana, de 42 anos. Mas o tempo passou e veio o Natal seguinte e outro e ainda mais outro. “Não é que não doa, ainda sinto saudade, mas já não tenho vontade de fugir. Já consigo estar sentado e dar comigo a sorrir quando recordo o momento em que ela apareceu vestida de pai natal, provocando o delírio entre a pequenada!”
 
Manuel, Alicia e Diogo apresentam-nos três histórias de Natal. São três histórias de vida, afecto e luto que não escolhem tempos nem datas para acontecerem. 
 
Para quem está em processo de luto, a chegada do fim do ano, com as festas de Natal e de Passagem de Ano, é aguardada com alguma ansiedade. A antecipação de como vai ser celebrada esta quadra familiar sem aquele ente querido, gera sentimentos de tristeza, revolta, agressividade, desespero, desalento e por vezes apatia. O desejo de passar pela época quase invisível é um mecanismo de defesa face ao sofrimento de encarar a festa de família e reconhecer que o seu ente querido já não está e, mais doloroso ainda, reconhecer que nunca mais vai estar presente. 
 
Várias são as estratégias adotadas. Por exemplo Manuel e a esposa optaram por celebrar o Natal longe da sua casa, para que a dor da ausência do filho David fosse atenuada. Já Alicia optou por dar continuidade à festa desta vez em sua casa, com o pai devidamente representado. Por sua vez, Diogo, mesmo tendo vontade de fugir na primeira vez, acabou por não o fazer e conformou-se com o facto de o Natal não voltar a ser como era antes da morte da esposa.
 
Na verdade, não há fórmulas nem receitas de como se pode sobreviver à primeira quadra natalícia sem os familiares perdidos. Manuel, Alicia e Diogo provam isso. Cada um deles celebrou o Natal de forma diferente. Não foi um Natal isento de dor, seria impossível, precisamente porque seria este o primeiro natal que iria tornar real a perda definitiva de quem amavam. No entanto, cada um destes enlutados optou por escolher o melhor caminho para si: no meio da dor, celebraram o Natal da forma que lhes fosse menos dolorosa.
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